segunda-feira, 21 de maio de 2007

Ancestrais...


Vejo muitas vezes as pessoas idealizando seus ancestrais: ancestrais que parecem muito pouco humanos para mim: sem erros, sem defeitos, sem falhas de caráter. Todos bruxos (!), todos sábios, tudo muito idealizado.

Não podemos deixar de lado que nossos ancestrais eram, antes de tudo, humanos. Com erros e acertos. E o que os torna mais incríveis e maravilhosos é exatamente isso: capazes de erros e acertos, eles conseguiram sobreviver e traçar um caminho.

Quando estudei mitologia, aprendi que o valor maior do Herói reside em sua capacidade de errar, que permite que nos aproximemos dele: não dá para almejar em vida a perfeição de um Deus. Mas o herói, sendo humano, errando, tendo fraquezas, consegue prodígios, consegue ser virtuoso. Podemos portanto nos espelhar nele: apesar dos nossos defeitos, podemos encontrar nos heróis ( e nos nossos ancestrais) um exemplo de que diante da adversidade e da falha, ainda assim somos geniais.

Minha bisavó era louca. Conheci dona Mercedes quando o mundo dela era toldado pela esquizofrenia. Hipocondríaca, e um pouco malvada. Culpava os filhos pelos problemas que teve na vida, e fez cada filha ter um casamento doloroso de algum modo, como se isso compensasse seu sofrimento. Acha que tenho menos orgulho dela por isso? Minha bisa era uma mulher linda. Era inteligente demais, genial mesmo. Em um mundo de gente ignorante, ela era formada. E em algo que a tornava poderosa a seu modo: era parteira. Criou os filhos transformando miséria em fartura. Enlouqueceu quando o marido a proibiu de continuar na sua profissão. Inteligência demais, tristeza demais, desencadearam a loucura, que foi se instalando devagar. Minha avó trabalhava fora, ela cuidou do meu pai. Quando minha mãe estava grávida, ela de olhar sua barriga, do outro lado do quintal, disse que eu seria menina, mas nasceria em posição de menino (todos diziam que era menino), e que nasceria atrasada. Sem minha mãe dizer, ela disse quando era a data prevista do meu nascimento. Uma mulher de fé, tinha uma relação toda especial com a morte. Quando minha mãe foi ajudar a vestir seu corpo, encontraram dentro do guarda roupa toda a roupa que ela mesma tinha escolhido e deixado preparada para o enterro, desde a anágua até o turbante (ela sempre usava lenços bonitos na cabeça).

Lembro de seus olhos meio cegos me olhando, olhando para dentro de mim, no mais fundo. Era miudinha mesmo perto de mim, que sou pequena.

Acho que o que mais amo nessa mulher tão contraditória é sua profunda humanidade. Acho que é isso que resume a minha relação com meus ancestrais: como eu, eles eram falhos, humanos. Posso aprender com eles: seus erros podem evitar que eu cometa os mesmo erros. Seus acertos iluminam o meu caminho. Não é preciso que eu idealize meus ancestrais: minhas ancestrais não era pagãs. Mas eram poderosas sim, ao seu próprio modo, dentro de suas fés e tradições, algumas das quais escolhi honrar em memória delas.

11 comentários:

Unknown disse...

Ancestrais idealizados... principalmente qdo falamos de descendência que não de sangue. Sempre houve muita gente muito sábia e boa praticante, mas nesse plano é difícil não achar lados de luz e escuridão nas pessoas.

Eu fico pensando o que vão dizer quando eu me tornar uma ancestral da família... era bonita, mas era rancorosa... era inteligente, mas era ácida... Era a Madrasta da Branca de Neve =)

Sarah Helena disse...

madrasta da branca de neve rulez...rsrsrs

putz, de mim dá pra pensarem tanto em cuidado com os outros como agressividade sem sentido... e tbm defesa de ideais e idéias, mas com certo radicalismo...

acho importante explorar os dualismos das pessoas, incluindo os ancestrais, porque isso nos torna mais próximos. Eu esqueci de dizer tbm que é preciso lembrar da época em que as pessoas viveram... não se pode julgar alguém pelos olhos de hoje, quando ela viveu a cem anos atrás...ou vinte.

Unknown disse...

Hum, olha só que belo blog.

Não vou postar em todos, mas somente no último.

Artigos todos bastante interessantes. Parabéns ^^

Inês Barreto disse...

Obrigada, Dianus!
Volte sempre!

Pietra, madrasta má foi ótimo!

Iony disse...

OLá meninas!estou muito feliz em saber que tem gente q tb pensa como eu!Adoro o blog de vcs,sinto-me em casa, como se conhecesse todas(alemd a Pietra!!rs)Escrevam muito mais!!Bjocas!

Inês Barreto disse...

Obrigada Dançarina!
Volte sempre à nossa casa! ;)

Beijos!

Luciana Onofre disse...

Abuelas, abuelos, reais, muito concretos de fato, eu não os nego nem idealizo, pq sei o quê foram, como foram e como concluiram seus dias...
Minha avó materna terminou seus dias "acreditando" que eu era a sua mãe, tornei-me sem querer meu próprio ancestral, no meio da sua senilidade demente, me via como a mãe que não lhe deu amor quando pequena e a tornou um ser duro e cruel, aí eu "a mãe escolhida" no fim dos seus dias lhe dei o amor que antes não dera, a mãe de fato.
O que aprendi? A ser menos dura, pois me pego às vezes sendo de ferro, sou hoje maleável se quiser...

Anônimo disse...

Adorei o texto. È verdadeiro e profundo. Idealizamos muitas coisas, desde a pessoa amada aos nossos ancestrais.Parece que eles eram realmente perfeitos e que nos somos perfeitos também. Acho que temos medo de enchegar quem realmente somos. De ver a verdadeira máscara. Muitos bruxos cultuam as sacerdostisas de outros tempos e se esquecem de cultuar seu próprio sangue, sua origem; um grande erro, ou talvez, imaturidade. Não sei ao certo. Mas, ambos tem seu valor e seu lugar. Ambos merecem ser por nos lembrados e respeitados.

beijos!

Anônimo disse...

Antes de conhecer o paganismo nao pensava em como nossos ancestrais podiam nos proteger e acender as luzes do caminho.Eu sempre vi meus parentes vivos ou mortos como boas pessoas,alguns mais chatinhos ,mas gostava de todos.Mas durante os ataques de raiava de algum lado a gente fica sabendo dos podres e das facetas escondidas deles.
Ai vc tem que tentar juntar os caquinhos daquela imagem que vc tinha com a nova.
Uns me jogaram baldes de agua fria e outros me apoiaram.
Familia é uma loucura!o que torna a vida mais loucamente feliz!

bjs

daniel guse

Achernar disse...

OLá! gostaria de dizer que seu texto é absolutamente lindo suas palavras me encantaram e me emocionaram muito,com lágrimas nos olhos, digo que me sinto abraçado por suas palavras por que é assim que vejo meus antepassados é assim que os sinto, agradeço muito e que voçê seja muito abençoada e protegida pelos seus ancestrais!!!
Bençãos de Fana e Fanus

Lobos da Nogueira disse...

Meu ex marido sempre disse aos meus filhos que eu era a madrasta por ser mito rigida. Desde minha infancia eu sempre adorei as bruxas más...minha mãe era muito má, realmente muito má, e eu me tornei um ser inamavel, venho resgantado a capacidade de amar há dez anos...E somente ano passado consegui amar um homem totalmente, embora tenha dado tudo errado estou feliz por aprender a amar.meus ancestrais...povo dificil o meu uma mistura de raças com um traço comum o judaismo... mulheres fortes,corajosas,todas más, segundo a geração que as sucediam. umdia meu filho caçula me disse"_Diabona, não vou mais te amar tu é muito má"
Eu nunca os amei como meus filhos, mas não gostei de ve-lo sofrer e resolvi que má eu não seria.Equando ele me entregou a filhinha dizendo " Ta ai a diabona vai saber criar a diabinha, agora ela é bruxa! eu agradeci as minhas ancestrais...valeu gente! parabens!